segunda-feira, 15 de outubro de 2007

O DISCÍPULO e o SWAMI




Passei minha infância numa casa com quintal. Virava e mexia, tínhamos um bicho novo, às vezes dentro de casa. Naquela sexta-feira meu pai trouxera, sob a pasta na qual guardava os importantes processos fazendários que ele julgava, uma caixa de sapatos. Amarrada com barbante grosso, a caixa emitia piados muito agudos através de inúmeros furos, o que redundou em alegre gritaria, minha e de meus irmãos, na seguinte conclusão, óbvia para quem é criado em quintais: pintinhos!

- Não. Replicou meu pai em tom sereno. São marrecos-de-pequim.

Pintinhos eram banais. Mas marrecos-de-pequim seriam motivo de orgulho no futebol de rua do dia seguinte. Aberta a caixa, extasiado, procurei naqueles bichinhos amarelos de bico achatado, os traços que na vida adulta os diferenciariam de meros patos. Naquela noite eu teria sonhado com marrecos suntuosos, quase pavões, nos jardins do imperador da China. Claro, se eu soubesse como eram os jardins do imperador da China. E quem precisava deles, já que eu tinha meus próprios jardins?

Os bichos cresceram, mas não cresceram marrecos-de-pequim, e sim três gansos trabalhosos e bravos, que não demorarama a criar família, com quem passamos a dividir nosso quintal. Chocada a primeira ninhada e a cena que me inspirou este pequeno comentário passou a reproduzir-se diariamente, até que, esgotada a paciência, gansos e ninhada, depois de crescida, foram doados por minha mãe ao Parque de São Bento, que mantinha um criatório de aves. Conosco ficou, como recordação, um filhote batizado de Paulinho. A cena: os pequenos seguiam o grande.

Discípulos são muito raros, porque ser discípulo é seguir o grande, até que, por força da própria natureza, nos tornemos grandes. O que mais vejo por aí é gente que se acha grande, fazer-se de pequena, para ver se fica maior ainda. Egooooooooooo! Pato, ganso ou marreco-de-pequim, seguir o grande, é seguir com a prórpria natureza, é fortalecer-se nela e depois seguir consigo mesmo e, eventualmente, ser seguido.

Este é o sentido da palavra "SWAMI". O que segue por si mesmo. E só torna-se capaz de seguir por si mesmo, porque um dia seguiu alguém, por tempo suficiente para amadurecer-se na "atitude de seguir". Isto é ser "DISCÍPULO". Quem segue a muitos, não segue ninguém. Se perde.

Divirto-me imaginando, Paulinho o ganso, deitado num divã ou fazendo algum workshop tentando convencer-se de que verdadeiramente não era um marreco!

Beijos carinhosos, OM Shantih! Com amor, Luiz.

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